terça-feira, 17 de agosto de 2010

POTENCIAIS DA AMAZÕNIA- AÇUDES DO NORDESTE

Ao longo do tempo a Amazônia foi alvo de intervenções desastrosas que marcaram profundamente o imaginário do povo da região. A única certeza que temos é a extrema ignorância acerca dos recursos naturais e dos riscos ambientais na região. Custa a crer que depois de tantas intervenções desastrosas, a floresta tenha permanecido incólume até os dias de hoje. Esta é a principal razão dos debates acalorados entre os diversos setores envolvidos, cada um tentando prevalecer seus argumentos como principal condicionante. Uns, tem uma visão demasiado otimista acerca da capacidade dos potenciais de suprir as necessidades do sistema Sudeste e Sul, uma visão exploratória que não contempla os riscos ambientais dos grandes reservatórios. Outros, tem uma visão de um meio ambiente que precisa ser protegido a qualquer custo, como um “patrimônio da humanidade”, uma espécie de “santuário ecológico”.
Os problemas da Amazônia envolvem aspecto de natureza sócio ambiental, políticas, técnicas e econômicos. Nenhum destes setores tem privilégio exclusivo de reivindicar para si a condição de determinante. Do ponto de vista sócio ambiental as restrições são genuínas, em vista dos antecedentes de interferência indevida. Do ponto de vista técnico, o problema está mal colocado. As reações dos ambientalistas a qualquer intervenção na Amazônia são naturais e espontâneas: tem a sua razão de ser tendo em vista o resultado da maioria das intervenções ali realizadas. Mesmo sem focar os argumentos apenas no aspecto ambiental, constatamos que, de todas as intervenções, até hoje não conseguimos encontrar uma sequer que não resultasse em fracasso retumbante. Os grandes vilões da Amazônia são as queimadas, seguidas da criação predatória de bois. Com o despertar da consciência ambiental no fim do século o olhar do mundo inteiro estará voltado para a região amazônica, pondo em xeque questões de soberania. Não é só a questão de emissão de gases do efeito estufa, mas também o efeito de grandes reservatórios que constituem fator elevado de risco potencial que podem alterar o clima de forma ainda não conhecida. Questões de segurança por via militar pode agravar ainda mais o isolacionismo que impede o real conhecimento da região. A melhor forma de integração é o conhecimento através da ocupação, cuja soberania vira a ser contestada pelo mundo todo. A melhor defesa é a ocupação por proprietários titulados que interferem pouco com o meio ambiente.
A Amazônia não deve ser vista apenas pelo ângulo particular de suas pretensas riquezas, mas pelo conjunto de riquezas e problemas inerentes a ocupação desordenada, que podem se complementar. Assim, por exemplo, em lugar de licitar o aproveitamento de recursos individuais, hidroelétricos ou minerais, para serem dados de “mão beijada” às empresas de produtos acabados eletro intensivos, a melhor providência é a licitação de todos os recursos que interferem com o conjunto de atividades integradas: suprimento de energia, mineração, navegação e proteção adequada ao mio ambiente através de cláusulas restritivas de área inundada (altura).
Será possível uma visão sistêmica que contemple o conjunto de todos os interesses envolvidos? Comecemos pelos interesses energéticos.
Do ponto de vista do sistema energético, a região amazônica não é, tipicamente, uma bacia única integrada, mas várias bacias isoladas, cujos rios de planície não têm ligação física com os rios do Sudeste o que é um obstáculo a integração. Geograficamente, é impossível integrar bacias que não se complementam alem da impossibilidade técnica da construção de reservatórios de regulação plurianual a semelhança do Sudeste. O relevo pouco acidentado na cabeceira de cada um destes rios é o responsável pela baixa eficácia do campo gravitacional tanto no aspecto ambiental como econômico. O fator altura h, decorrente do relevo, não se reflete apenas no custo dos equipamentos e vertedores, mas principalmente no custo do reservatório, raso e largo, com área inundada proporcionalmente maior, relativamente ao volume armazenado, Mas, o custo do reservatório não corresponde apenas ao valor de mercado da terra inundada, o que seria algo suportável em uma região devastada como a do reservatório de Furnas, por exemplo. É o fato de a inundação ocorrer em área da floresta amazônica que torna o custo ambiental infinitamente maior e, portanto, o efeito altura mais evidente. Se não é aceitável um reservatório das dimensões do de Furnas em Belo Monte e foi necessário reduzir sua área para diminutos 400 quilômetros quadrados, para que o licenciamento ambiental fosse aprovado, como justificar um reservatório com área dez vezes superior, em qualquer reservatório de cabeceira dos rios Xingu, Tocantins, Tapajós ou Madeira?
Construir reservatórios na Amazônia é “chover no molhado”, isto é, transformar a região mais inundada do mundo num gigantesco espelho d’água, capaz de interferir no clima. Significa repetir a experiência mal sucedida da construção de açudes que transformou o nordeste no semi-árido mais inundado do planeta.
A região amazônica não deve ser vista do ponto de vista estreito de cada uma de suas riquezas presumidas, mais de uma forma sistêmica do conjunto de suas riquezas e problemas que se complementam. Assim, por exemplo, ao invés de licitar hidroelétricas para serem dadas de “mão beijada” às empresas de produto eletro-intensivo, licitar o conjunto, usina, minérios, navegação, etc., com vinculação de royalties e limitação de áreas inundadas. A usina de Belo Monte reúne duas condições para se tornar objeto de uma licitação do tipo sugerido.
Pela planície úmida da Amazônia correm rios torrenciais de discreto número de bacias: Juruá, Tefé, Purus, Madeira, Tapajós e Xingu. A concentração das chuvas e o tamanho das bacias, mais do que a pluviosidade, é a causa principal da grande vazão dos rios, capazes de produzir grande quantidade de energia em curto período, ou seja, são rios de potência. É impossível, geograficamente, construir reservatórios de grande volume que não formem grandes espelhos d’água. Mas, mesmo subutilizados (low profile), os potenciais da Amazônia ainda conseguem produzir energia a custos compatíveis (80 US$/ KWHORA), relativamente a outras fontes de energia renováveis. .
Alem de tudo isso, é preciso ter em conta que os vertedores das usinas da Amazônia serão muito maiores, não apenas porque chove mais na região, como muitos pensam. Pode ser que chova o dobro, mas a razão principal reside no fato do grande volume d’água se escoar mais rapidamente, como acontece na cidade de São Paulo. Alem disso, podem servir ainda a propósitos específicos de navegação e exploração de comodities metálicas.
A navegação constitui a variável sistêmica capaz de integrar toda a região amazônica de modo a romper com a condição de isolamento a que estão submetidos os atuais ocupantes e permitir a exploração não predatória de recursos naturais (energia, minerais agricultura) sob um regime de subaproveitamento planejado (sustentável). Oferece oportunidade única na história dos países vizinhos de exploração conjunta, na forma de cooperação espontânea. Um bom exemplo de cooperação é o que está acontecendo com os países vizinhos através das multinacionais brasileiras (Petrobras, Embrapa, Votorantim, Gerdau) na exploração do gás da Bolívia, hidroelétricas do Equador, agricultura na Venezuela , zinco no Peru. Alguns produtos estratégicos básicos se destacam: a exploração do gás e da maior jazida de “litio” do maior deserto salino do altiplano boliviano e do “Indio”, resultante do reaproveitamento dos resíduos da exploração do Zinco em território peruano. A exploração dos potenciais hidroelétricos dos Andes é uma grande oportunidade de formação de consórcios, dos quais o Brasil tem experiência comprovada, capaz de firmar a liderança que vem exercendo nos países da comunidade Sul Americana.
Os potenciais da Amazônia, vistos como promissores, estão sendo superestimados: ou são usinas de fio d’água, incapazes de constituir estoques de energia, ou são usinas de baixa altura que, para produzir energia de modo eficaz, necessitam de reservatórios imensos e inócuos.
A usina de Belo Monte, considerada a “melhor do mundo” pela Eletrobrás, constitui um bom exemplo para explicar a diferença dos conceitos de energia e potência. De fato, tem tudo para se tornar um “bom” empreendimento: altura razoável de cerca de 90 metros, aliado a um reservatório diminuto, correspondente a ocupação da área de 400 quilômetros quadrados (10X60 quilômetros), inferior a área de qualquer açude nordestino ou município brasileiro. Custa a crer que, em tamanho espaço da Amazônia, os índios estejam confinados à calha do Rio Xingu. Ora, se não conseguimos discutir racionalmente um problema tão pequeno, em termos de reservatório, qual a dimensão que o mesmo problema vai ter quando as coisas se tornarem um pouco mais difíceis, demandando reservatórios que ocupem áreas maiores, da ordem das ocupadas por açudes nordestinos ou do total dos reservatórios do Sudeste? As usinas de montante certamente vão necessitar reservatórios de área muito superior a 400 quilômetros quadrados para regularizar a vazão do no Rio Xingu, para que deixe de ser, tipicamente, apenas uma usina de fio d’água. Isto mostra que as restrições socioambientais vão continuar e a estratégia utilizada com sucesso no Sudeste não pode ser repetida simplesmente. O planejamento dos potenciais da Amazônia necessariamente deve ter um enfoque diferente. Os grandes reservatórios representam para a região amazônica o mesmo papel que os grandes açudes representam para a região nordeste: imensos espelhos d’água, “somando, hoje, o fantástico número de 70.000 reservatórios, tornando o Semi-árido, a região mais açudada do Planeta. Não há região no Globo, árida ou semi-árida, com tamanha capacidade de acumulação, um cubo de 37 bilhões de m³, um terço do que o São Francisco despeja anualmente no Atlântico. Numa distribuição geográfica eqüitativa disporíamos de um açude a cada 14 km² por toda a superfície do Polígono das Secas”.

OS AÇUDES DO NORDESTE

Por cerca de dois séculos acreditamos na premissa de que o problema de seca se resolveria com a construção de grandes açudes. O imperador construiu o primeiro deles e, de lá para cá, o mesmo procedimento foi seguido pelos presidentes da velha e nova república, reforçada com a construção de grandes represas hidroelétricas. Hoje, O Nordeste se transformou no semi-árido mais inundado do planeta, com setenta mil açudes, cujo espelho d’água é muitas vezes maior do que o de todas as usinas hidroelétricas reunidas do Sudeste e Sul. Com as perdas inerentes de evaporação e infiltração, se transformaram em lagos de água salobra, impróprias para o consumo humano e animal. Agora estamos transferindo água doce do São Francisco para mistura com água salobra ou constituindo novos depósitos de água para se tornarem salobras. Será que não corremos o mesmo risco na Amazônia? Afinal, geograficamente as duas regiões se assemelham. Será que não corremos o risco de chover no molhado, ou seja, transforma a região mais úmida do planeta em um imenso espelho d’água, capaz de alterar o clima de todo o mundo?
Por mais paradoxal que pareça, a região norte é a mais indicada para instalação de térmicas para continuar tendo suprimento adequado a populações locais.

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